China – História Imperial

A civilização chinesa conta já com mais de quatro mil anos de existência documentada. Os grandes rios que percorrem o território impulsionaram o desenvolvimento da agricultura nos primórdios das grandes civilizações e nessa altura o sedentarismo começou a ganhar expressão.

A China é considerada a civilização mais antiga do mundo em existência e desde a criação do seu império que é considerada uma nação próspera e culturalmente avançada, graças em parte aos seus recursos naturais.

A constituição do Império Chinês data do ano de 221a.C., quando o primeiro imperador Qin Shi Huangdi iniciou a primeira dinastia Qin e unificou os vários estados feudais que compunham o território chinês. No decurso de dois milénios, a China Imperial foi governada por apenas sete dinastias e a estabilidade e continuidade destas apenas foi abalada durante as fases de transição das dinastias[i].

É interessante saber que nem sempre o Império foi governado por dinastias de origem chinesa.Duas destas dinastias pertenceram a povos considerados de origem bárbara[ii] pela maioria Han. A dinastia Yuan era de origem Mongol e governou entre 1271 e 1368. A dinastia Qing era de origem Manchu e dirigiu o destino da China no período de 1644 a 1911, até ao final do império.

Os períodos de turbulência vividos durante as fases de transição tinham normalmente a sua origem na contestação do povo perante os privilégios da pequena elite que, no seu entender, corrompia o poder político e o seu prestígio. Esta é uma característica importante a reter do período imperial. Os governantes sempre reclamaram para si a honra e a virtude de governar a poderosa civilização chinesa, os chineses apelidavam-nas como o Mandato dos Céus.

Apesar da alusão a uma espécie de divina tarefa, a população teve sempre a capacidade suficiente para derrubar os seus governantes e o sentimento momentâneo de insatisfação disseminava-se pela sociedade chinesa com uma rapidez impressionante.

Em meados do séc. XIX, começa a desenrolar-se uma série de eventos importantes para a história moderna e o declínio do Império Chinês. Desde o século passado que o império procurava a todo o custo controlar as suas relações comerciais com o exterior aplicando medidas de restrição a estas mesmas.[iii]

A atractividade da economia chinesa e o seu potencial fez com que as nações ocidentais tentassem nesse período obter privilégios comerciais com o império. Contudo, a diplomacia ocidental nunca atingiu as suas intenções. Na década de quarenta do séc. XIX, o desentendimento diplomático entre a Grã-Bretanha e o Império Chinês dá origem a uma ofensiva militar britânica que desencadeia a famosa “Guerra do Ópio”[iv] (1939-42). O Império Britânico saiu vencedor e obrigou o império derrotado a assinar o Tratado de Naijing.

No tratado, a China era forçada a prestar uma série de concessões aos países ocidentais, incluindo a abertura das suas relações comerciais ao Ocidente e a cedência do entreposto comercial de Hong-Kong à Grã-Bretanha. A assinatura do tratado continua ainda hoje a ser considerada uma humilhação imposta ao povo chinês. Na Região Administrativa Especial de Hong-Kong, a população chinesa também guarda algum ressentimento em relação aos britânicos e a transição desta não foi pacífica aquando da sua devolução em 1997. Por curiosidade, note-se que em Macau o sentimento é precisamente o inverso do anterior e a passagem de Macau para as autoridades chinesas decorreu de forma absolutamente pacífica. Portugal continua ainda hoje a manter boas relações diplomáticas com a República Popular Chinesa.[v]

Regressemos à sua história. No início do séc. XX, a população chinesa começa a expressar o seu sentimento de revolta perante o desprestígio do imperialismo chinês, a corrupção entre os membros do aparelho burocrático e a sua submissão ao Ocidente. Analogamente ao que é referido mais acima, o comportamento da população começa a ameaçar a soberania imperial e culmina naquela que é conhecida como a “Revolta dos Boxeurs”. No entanto, a rebelião é literalmente esmagada com o auxílio militar dos países estrangeiros que exploram as concessões chinesas.

Nesta primeira década, a fome e a pobreza generalizadas assolam a população chinesa de maioria Han. A tensão social é o factor que precipita a criação dos movimentos populares nacionalistas de espírito reformista e revolucionário. Em 1910, há uma tentativa falhada de golpe de estado liderada por Sun Yat-sen que fica conhecida como a “Revolução de 29 de Março”. Curiosamente nesse ano a escravatura é oficialmente abolida.[vi] Um ano depois, um conjunto de rebeliões armadas toma o controlo de todas as províncias chinesas e, em 1912, a República Chinesa é proclamada por Sun Yat-sen. O regime republicano começa assim com o fim de mais de dois milénios de governação imperial.[vii]

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(este texto é parte de um artigo escrito em Maio de 2009)

[i] Michael Dillon, Contemporary China – An Introduction (New York: Routledge, 2009), 10

[ii] “Some of the most important dynasties in Chinese history were of non-Chinese (or, as far as many Chinese were concerned, ‘barbarian’) origin. The ruling elite of the Yuan dynasty was Mongolian and the aristocracy of the Qing dynasty was Manchu; both of these came from people who had their origins in nomad tribal confederations of the vast regions to the north of China. Their languages, cultures and traditions were quite unlike those of the Han Chinese although proximity, trade and confl ict had led to linguistic and cultural borrowing in both directions over the centuries.” in Michael Dillon, Contemporary China – An Introduction (New York: Routledge, 2009), 11

[iii] Nuno Valério e Ana Bela Nunes e Nuno Valério, História da Economia Mundial Contemporânea (Lisboa: Editorial Presença, 2004), 71

[iv] “The Opium War is called by this name because it was the determination of the Qing court to bring to an end the British sale of opium to China that led to hostilities: on both sides, however, it was widely accepted that the issues in contention were far greater than just the trade in a narcotic, however much this was resented by China. China’s territorial integrity and the question of who should exercise control over its foreign trade were at stake.” in Michael Dillon, Contemporary China – An Introduction (New York: Routledge, 2009), 11-12

[v] Agência Lusa, “Jaime Gama enaltece ‘boas relações (Maio 5, 2009)’”, Agência Lusa, http://www.lusa.pt/lusaweb/user/showitem?service=310&listid=NewsList310&listpage=1&docid=9633764

[vi] “The Imperial government formally abolished slavery in China in 1906, and the law became effective on Jan. 31, 1910, when all adult slaves were converted into hired labourers and the young were freed upon reaching age 25.” in Encyclopedia Britannica, “Slavery (sociology), Ways of ending slavery”, Britannica Online Encyclopedia, http://www.britannica.com/EBchecked/topic/548305/slavery/24160/Ways-of-ending-slavery.

[vii] Em relação à continuidade e estabilidade da República Popular da China, há um pequeno excerto da autoria dos historiadores Nuno Valério e Ana Bela Nunes que julgo ser útil a ter como referência. Citação: “O papel que a China virá a desempenhar na vida mundial no século XXI depende basicamente do modo como evoluirá a sua situação em relação a três dificuldades importantes que sente a curto prazo: o atraso, o risco de desagregação e a indefinição política. Se tais problemas forem superados, a China será indubitavelmente uma grande potência económica do século XXI. Caso contrário, a China deverá continuar a viver numa posição relativamente secundária.” in Nuno Valério e Ana Bela Nunes e Nuno Valério, História da Economia Mundial Contemporânea (Lisboa: Editorial Presença, 2004), 247